Brasil tem 68 projetos de leilão em andamento e 146 paralisados
Existem atualmente 95 contratos assinados com o setor privado na área de água e esgoto, a maioria em pequenas cidades. Expectativa é que novo marco legal facilite a abertura do mercado, mas impacto no curto prazo deve ser limitado.
Levantamento da consultoria Radar PPP, que monitora o mercado de infraestrutura, mostra que 2 em cada 3 projetos no setor de saneamento básico anunciados nos últimos anos estão paralisados, e que a maioria são iniciativas de municípios. O estudo, obtido com exclusividade pelo G1, identificou 68 projetos em andamento no país e 146 paralisados.
O mapeamento mostra ainda que existem atualmente no país 95 contratos assinados com o setor privado na área de água e esgoto, sendo 75 concessões e 20 PPPs (parcerias público-privadas). Veja quadro abaixo:
De acordo com o levantamento, dos 95 contratos já firmados no país, a maior parte está concentrada em São Paulo (24), Tocantins (17) e Santa Catarina (11), com contratos com duração média de 29,5 anos.
“Desde janeiro de 2017, foram celebradas 36 novas concessões comuns. Mas, em regra, são iniciativas em municípios de menor porte, que dinamizam o mercado, mas estão distantes de contribuir decisivamente para o desafio da universalização do saneamento no país”, acrescenta.
Atualmente, o saneamento é prestado majoritariamente por empresas públicas estaduais. Segundo a Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), a iniciativa privada opera atualmente em apenas 6% dos municípios do país, somados todos os modelos de contrato.
Apesar da pequena fatia de mercado, a iniciativa privada já responde por cerca de 20% dos investimentos feitos no setor no Brasil. Segundo a associação, o total de investimentos previstos nos contratos já firmados é da ordem de R$ 37 bilhões.
Impactos do novo marco do saneamento
O Plano Nacional de Saneamento Básico prevê a universalização dos serviços de água e esgoto em 2033. Na avaliação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), entretanto, se mantido o atual ritmo de investimentos, o país só alcançará essa meta na década de 2060.
“Os investimentos em saneamento básico no Brasil não passam, hoje, da média de R$ 12 bilhões anuais. É necessário pelo menos dobrar essa quantia para que a maior parte dos brasileiros tenha acesso a redes de esgoto em um horizonte de 13 anos”, afirmou a CNI, em nota.
A expectativa do governo e do mercado é de que o novo marco legal do saneamento, aprovado recentemente pelo Congresso, facilite uma maior participação da iniciativa privada e contribua para elevar o volume de investimentos no setor. Para o país conseguir universalizar os serviços de água e esgoto estima-se uma necessidade de mais de R$ 700 bilhões de investimentos.
“As empresas estatais sempre foram muito defensivas no que diz respeito a uma participação mais intensa da iniciativa privada. Agora, vão ter que recorrer a parcerias por pura e simples pressão e necessidade de que os contratos e programas cumpram as metas prometidas”, afirma Pereira, citando a obrigatoriedade de abertura de licitação para a prestação de serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, e o fim do direito de preferência das companhias estaduais.
O Radar PPP avalia, porém, que um salto no número de concessões e PPPs em água e esgoto só deverá ocorrer no médio prazo, uma vez que o novo marco também admite que os atuais contratos firmados entre as companhias estaduais e municípios sejam renovados, o que pode garantir uma sobrevida ao atual modelo.
“É como se a gente estivesse no último respiro do modelo antigo, mas ainda há dois, três anos para que isso seja formalizado. As empresas estaduais ainda têm um prazo para fortalecer suas posições na sua base territorial”, explica.
Analistas ouvidos pelo G1 alertam para alguns desafios e estimam que um maior número de leilões só deverá ocorrer a partir de 2022. Na avaliação do mercado, há interesse do setor privado nos projetos já anunciados e na atividade de saneamento em geral, mas é preciso agilidade também na regulamentação do novo marco e na estruturação da Agência Nacional de Águas (ANA).
Na avaliação da agência de classificação de risco Moody’s, a aprovação do marco legal é positiva para a ampliação dos investimentos privados no setor de saneamento, uma vez que contribui para a padronização do ambiente regulatório, hoje bastante fragmentado com mais de 50 agências diferentes.
“Dada a situação fiscal desafiadora dos entes públicos, este marco legal também favorece a privatização de empresas de água e esgoto, ao mesmo tempo em que garante a manutenção de contratos assinados com municípios”, afirma a analista da Moody’s Nicole Salum.
Dos 68 projetos em andamento, 18 são estaduais
Dos 68 projetos em curso, 50 são de municípios e consórcios públicos e 18 são iniciativas estaduais. Entre os maiores, destaque para a concessão de água e esgoto na região metropolitana de Maceió, a PPP de esgoto da Empresa de Saneamento de Mato Grosso do Sul (Sanesul) e concessão da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae).
De acordo com o levantamento do Radar PPP, os 18 projetos estaduais incluem iniciativas em 13 estados: Alagoas (2), Tocantins (2), Piauí (2), Ceará (2), Pernambuco (2), Acre, Amazonas, Rio de Janeiro, Pará, Bahia, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Espírito Santo.
Entre os projetos estaduais, 8 estão sendo estruturados pelo BNDES, e foram iniciados após o lançamento do programa de concessão de companhias de água e esgoto, em 2016, no então governo de Michel Temer. Apesar das incertezas no cenário econômico, o BNDES prevê realizar 3 leilões no setor de saneamento ainda em 2020, incluindo o da Cedae.
Na avaliação de Pereira, o modelo de concessão tende a enfrentar maior resistência das companhias estaduais, uma vez que implica em transferir para um agente privado o controle da receita da arrecadação de tarifas. Já na PPP, há a possibilidade de manutenção da gestão comercial e abertura de licitação para um cronograma específico de obras ou serviços.
No caso da Cedae, por exemplo, a concessão da companhia ao setor privado foi uma exigência do governo federal para a adesão do Rio de Janeiro ao Regime de Recuperação Fiscal proposto pela União em 2017 em meio à grave crise do estado.